Inércia

Minha vida se tornou um disco velho, arranhado, chiando baixo e rouco, forçando a agulha agarrada num mesmo ponto, repetindo: inércia, inércia, inércia...

“Inércia, s.f. Preguiça, indolência, torpor.
(fís.) propriedade que tem os corpos de
persistir no estado de repouso ou de
movimento enquanto não intervém uma
força que altere este estado.”

"Enquanto não intervém uma força que altere este estado." Estado mesquinho, quase vergonhoso, de ver o TEMPO passando, e às vezes nem vendo, por negligência ter fechado os olhos. Estado medíocre, vida medíocre, pessoa medíocre que me tornei. Prestei demais atenção aos outros e me dediquei pouco a mim mesmo, mas não por gostar mais dos outros, nem mesmo por gostar pouco de mim. Eu apenas acabei sendo vítima das minhas escolhas: estar com as pessoas erradas, morar no lugar errado, estudar o curso errado, trabalhar no lugar errado, enfim, trilhar o caminho errado. Errado e inútil. Um beco sem saída e sem volta, porque o tempo não volta, o tempo só passa.

"Enquanto não intervém uma força que altere este estado." Enquanto não acontece algo. Enquanto não se abre uma porta. Enquanto isso o tempo passando e a vida girando, como um disco numa vitrola, em seu próprio eixo, sem ir a lugar algum. Enquanto isso eu perdendo o ESPAÇO. Enquanto isso eu esperando. ESPERANÇA. Mas esperar não é saber. Quem sabe faz a hora, não espera acontecer*. E eu não sei. Apenas sinto que estou a ponto de saber.

"Uma força que altere este estado." Uma FORÇA, um auxílio, mas nada de conselhos, porque minha inércia está entre o torpor e o estupor. Não cabem palavras, é preciso uma ação, um acontecimento, um golpe, um empurrão na agulha. Meu problema não é psicológico. O meu problema é físico. TEMPO, ESPAÇO, MOVIMENTO. O meu problema é a inércia.

Ao menos a agulha ainda insiste.

*Citação: “Pra Não Dizer Que Não Falei das Flores” - Geraldo Vandré

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